estamos fartos de sítios vazios.
lugares que nos vão deixar um dia. sabemos que a vida é o passo antes da morte,
e talvez por isso nunca saibamos qual o passo certo a seguir. gostava que os
unicórnios se beijassem. na boca. gostava que o jardim fosse cor-de-rosa. e as
casas. e as luzes. e as árvores. e as trevas. nunca soube responder o que
queria no natal. talvez devesse ficar contente pelo facto de ter alguém que me
quisesse dar uma coisa no natal. mas se aquilo que mais queres é inalcançável
aos comuns puritanos, seria lógico perder a sanidade com artifícios materiais
que me distraíssem do foco? se cortar os pulsos faz sangue, porque é que usamos
isso para cortar a alma e ver se ela ainda sente? se cortar os pulsos
funcionasse como cura então terminariam todos os problemas com um saco cheio de
cicatrizes. nunca soube ler poemas. nem textos. daquele jeito bonito. nunca
soube ser eu. aprendo a ser com os outros à medida que nasço. nunca entendi o
que faço aqui. cada vez menos. se aquilo que planeei não é aquilo que tenho,
então risco os pulsos e escrevo de novo. gostava que os unicórnios se
beijassem. gostava de fazer amor com poemas e cortar as asas aos anjos. um dia
o meu pai matou-me num pedaço de palavras soltas. para ele foi só comer sopa,
para mim foi rasgar os pulsos. um dia a mãe cansou-se de ser forte e eu
cansei-me de ser tudo. às vezes acho que percebo a mãe. às vezes acho que vou
ser como o pai. uma noite vou ter um bebé nos braços e se não o partir em
pedaços, vou dizer-lhe palavras bonitas. amor, não quero que ele rasgue os
braços. amor, eu estou feito em pedaços e não sei como encher os sítios vazios.
amor tenho frio. o próximo passo é cego, então. fico contigo?
kowo, o que
queres para o natal? podem ser canetas.
kowo, o que queres para o natal? quero
uma caneca.
kowo, o que queres para o natal? PORRA, podem ser poemas.
avô, só quero ler-te poemas.
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