Almas

20130311

pele. corpo. saudade. alma.


a trovoada come-me os nervos porque me leva às memórias. esta chuva que me assenta na pele, amolece-me a carne mutilada. com este tempo não há corvos, nem mochos que me soem aos ouvidos, nem as bruxas saem à rua para me espreitar. sigo vagueando a alma ferida, fugido à chuva, fugido da morte que pairou sobre mim. prendo-me ao tempo porque este pode não chegar para amanhã gritar perdão. enquanto os olhos se fecham no olhar a minha vida corre para trás. os meus braços tremem porque sentem o que digo, a minha pele arrepia e os meus olhos choram sem saber porquê. o molhado do chão queima com os sentimentos que nele piso e alguém teve vontade de me procurar na chuva. já a conheço de outras histórias e já a curei de outros males. as teias com que cobre o rosto são como cofres que escondem as linhas daquilo que viu. eu sempre procurei as chaves com flores que lhe abrissem o olhar, mas ela sempre achou melhor matar-me antes de qualquer tentativa de a salvar. eu não lhe iria falhar porque sempre a amei e ela nunca me amaria porque é uma encantadora de sonhos e eu próprio sei que os sonhos não existem. eu e ela somos um crime em primeiro grau e é a tristeza a linha da nossa saudade. as tintas do nosso tom de pele embebedam o sangue por nós derramado noutras vidas. eu peço sempre para ela fugir de mim, porque a minha alma já fugiu também. foge, porque eu vou ficar sempre aqui, talvez para te ver partir todos os dias, talvez para me ver ficar todas as noites. a saudade é minha amiga, a estrada leva-me ao fim do nada e contigo chegaria ao fim de tudo. se o céu não era o meu destino, porque é que a vida não soube gritar? se a vida não era inimiga porque é que ela não me pode ajudar? o tempo nunca foi meu e a morte foi tão certa quanto a dor. voa, que o tempo também voa. sinto-me perdido a cada dia que passa, sinto-me sozinho a cada dia que voltas. já morri por ti e voltaria a viver por outro alguém que soubesse o meu nome. por vezes ainda espero, outras desespero e por algum motivo ainda corro no fundo do poço tentando chegar ao topo. mas no fim de cada dia sei que estou no mesmo sitio de sempre, a despedir-me de quem vai e de quem nem considera ficar por mim. é o meu destino. despedidas e falsas amantes. finjo muito bem o que me vai, tão bem que nem eu percebo o quanto me engano. lágrimas disfarçadas por sorrisos que ninguém percebe serem de dor. e saudade de quem ainda há-de vir. se um dia for feliz é porque a saudade se esqueceu de mim e traí o passado com o presente. no dia em que for feliz, a trovoada irá deixar-me memórias e a chuva curará a minha pele. na tua.

4 comentários:

  1. fizeste-me sorrir agora... obrigada pelas tuas palavras!

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  2. Está muito bom, tem muito sentimento.
    Vou passar aqui mais vezes ;)

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  3. Obrigado pelo comentário!
    Obrigado por seguires!

    Quanto ao texto, uma mescla de sentimento imunda-nos quando se lê e isso é óptimo. Está muito bom!

    Irei passar por cá sempre que possível.

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