o que mais custa é o desapego. é
sempre o desapego. é esperar e não vir. e quando chega, se chega, não chegar.
em si. o suficiente. fingir que veio. que apareceu. enganar um dia mais. uma
noite a menos, sem dormir. o que mais custa é a expectativa. é achar que vai
ser assim e não ser nada. ou se chegar a ser, não ser, por ser tão pouco. já
não ter para dar. já não querer. perder-se entre o mar e a montanha. entre a
vila e a cidade. em sítio nenhum. no fundo o que custa não é o amor. o amor é
única farpa que nos entra nos dedos e não dói. o que dói é carregar sozinho as
memórias de dois e desapegar. é desenlaçar a mão ao vento se já ninguém a pode
segurar e expectar nada. o que dói é a mentira. fingir que está tudo bem e a
alma gritar que está tudo mal. deitar sozinho e acordar só. ou não acordar de
todo, se assim o corpo não deixar sequer dormir. não quiser dormir. até para o
dormir é preciso deixar. desapegar. não esperar nada. meu amor e essa casa onde
habitas. quem és? chegaste? de onde chegaste? partiste? fecha a porta, por
favor. às vezes aqui faz frio. às vezes encontro a paz que procuro, mas não
chega. tranca a porta do lado que mais queiras. meu amor, talvez parta antes de
chegares. amanhã. se não ficar foi por ter esperado de mais. onde a alma não
sente, o coração não se agita o suficiente para ficar. para ter de ficar.
esperar também é uma virtude. amar é um pecado, mas deixar de amar é um crime.
desamar. ir desamando e sentir-se. notar-se ao de leve, até ficar carregado.
todos os dias um bocadinho mais. como o branco que fica preto, o amor
transforma-se em muitas coisas. em muitos ós, em muitos nós e muitos não vás
já. fica. mas se ninguém pediu para ficar. então ó, parti, até já. se quiseres
vem buscar-me. fundo. estou fundo. mas não te enganes. não desta vez. não me
enganes. não desta vez. se eu partir e olhar para trás, não grites que me amas
se sabes o quanto de ti amei. não grites que me amas, se não deres o quanto te
dei. não grites que me amas, pois foi por ti que matei. me matei. me parti. chacinei
tudo o que de mim conhecia só, para agora aprender a me abrigar sozinho.
aquecer-me de novo sem alma. sem corpo. sem chão. sem ti.
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