entrava sempre mar dentro como se ele o chamasse para o abraçar. nadava lado a lado com a sombra que lhe gritava aos ouvidos pra morrer. deixava-se ficar na eternidade de alguns segundos, enquanto as ondas o repudiavam para terra. nem o mar o queria, nem tampouco o levava para um fundo de tesouros onde encontrasse a sua riqueza. acordava todas as manhãs na areia que despia o seu nome e olhava em volta da garrafa que lhe embebia o ser. estendeu a mão e ninguém o viu, abriu os olhos e não viu ninguém. durante tanto tempo não viu ninguém. estaria já morto sem saber, mas vivo ainda para sobreviver. perdeu-se dela pois ela nunca o agarrou, e nunca encontrou mais ninguém que soubesse por o seu nome junto do peito, num recanto da alma. tentava afogar-se todas as noites junto do cais que o viu nascer. onde a ribeira foi palco da sua infância e os barcos os quartos dos seus primeiros amores. passeava durante o dia naquela cidade fria de inverno, via saudade em rostos pintados de branco, sem coragem para perdão e via o amor nos olhos dos negros, embora famintos de alguém que lhes desse a mão para os salvar da vida. bêbedo sentia a desgraça cair-lhe aos pés com a força do mundo, sóbrio sentia a saudade de a conhecer. saudade de ela o ter morto de solidão. a vida deixou-lhe buracos a que alma não resistiu, levou com tiros no peito que feriram a fé e lhe destruiram o carinho. a saudade não foi mais do que medo de a esquecer. mentira. a saudade foi só saudade e o seu erro foi ter misturado sentidos. cada um é algo diferente, alguns semelhantes mas sempre diferentes. misturar sentidos é tornar uma dor ainda mais complexa. a saudade era saudade. dela. o medo era o medo. do seu nome. rashid. o nome que o medo não o deixava lembrar. yarin. o nome que a saudade não esquecia. ele sempre foi do sentir, ela nunca quis que ninguém a sentisse ser sua. ver a chuva naquela cidade era o seu teatro. não havia melhor peça que lembrasse as personagens da sua história. adorava ver as nuvens chorar, pois achava que eram os céus a acolheram a sua dor, a chorar aquilo que lhe pertencera outrora. mas sejamos realistas. as nuvens não choram, só desvanecem deixando cair a água que não lhes pertence. e se nem a água pertence às nuvens, como poderia ele achar que ela lhe pertencera um dia e ainda os céus chorassem por algo que nunca foi seu? ninguém nos pertence quando achamos que sim. e se o acharmos por certeza, a vida trata de mostrar que não. ele, enfrentou a escolha entre ser alguém e não ser nada e preferiu ser a ilusão de ser tudo para alguém. e no dia que escolheu uma ilusão, perdeu a oportunidade de alguém o amar enquanto ouvia a sua morte. no dia em que escolheu uma ilusão do passado, perdeu uma realidade do presente e morreu de dor. afogado. no dia em que se iludiu que o mar não o levaria daquela vez, já que nunca o havia feito antes. afogou-se e levou a dor como sua maior riqueza. iludido na realidade de ser tudo para alguém, quando achou que alguém era tudo para ele. o mar levou-o, porque o queria para ele numa realidade, e ele foi, porque queria o mar numa ilusão!
A história "dele" poderia ser a história de muitos.
ResponderEliminarGostei ;)
ResponderEliminarObrigada Kowo :) e esta mágoa doce e terna foi outrora um amor amargo e frio, mas agora já não tem muita importância, porque tudo passa como as estações. um beijinho!
ResponderEliminarPosso te pedir para não te perderes dela...?
ResponderEliminarBeijinhos,
Pensando com Arte.
Mas que belo texto, tão sentido!
ResponderEliminarr: obrigada pela dica :)
ResponderEliminaré um texto triste mas lindo.
escreves muito bem.
Gostei, gostei :)
ResponderEliminarobrigada por seguires :)
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