Almas

20160420

tic-tac


tic-toc, quantas feridas no meu corpo são tuas? 
tic-tac, parto a louça, rasgo a pele e como duas.
solidão é o caminho da vergonha. agonia são as paredes do abismo. picotado, picotado, só mais um traço em que me perco e me marco. se sismo, parto. ai, ai, ai, isto dói, mas nunca tanto como a dor. quem me dera ser mais forte que o vazio. é tão triste o que sinto e os pés gemem de dor como abanicos. o que sinto é tão triste e as mãos só pedem sempre mais um risco. é suposto me perder para me encontrar. drenar. escorrer. nada escorre, secura, é preciso ir somente mais fundo. os meus olhos são aquilo que eu não minto. a boca foge de quando em vez porque não encontro as palavras deste labirinto. custa tanto ser mulher. ser melhor. se a luta não é suficiente, morramos todos. dementes. colapsados pela vontade de morrer. de sofrer. de sentir. magoar para sentir. mais além. mais. algo. é preciso sentir algo. a companhia de algo. companhia para morrer. abrir um risco para sentir a companhia de nós mesmos. é uma fúria sem lei, aprisionada pela mentira de nós mesmos. solta-te e vai. sangue. pinta as paredes e corre. vida. quem me dera ter mais para viver, se assim morro. perco tempo. quem me cala estas vozes? quem me fode os tendões onde me suporto com o peso de nada? nada? só queria ser tudo. ser tanto. ser mais além do que em vão. mais forte que o vazio de não ter ninguém. o meu Deus fala entre linhas de desespero. Entrelinhas. é a guerra, é a fome e eu não quero marchar mais além de onde tenho raízes. voar, deixar escorrer-me e partir. é sádica a vontade nobre de morrer. honra o teu nascimento. não pediste? não morreste. não. nada. pouco. somente.
tic-toc, quantas feridas no meu corpo vais sarar?
tic-tac, junto os cacos, desinfecto e bebo duas. doses. solidão. agonia. será isto o abismo? ou só o fim da queda?
tic-tac. tic-toc. tic-.

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