Almas

20161128

dos montes brancos


existiu vida nas montanhas do norte. talvez nunca alguém tenha pensado em quantos corações perdidos podem ser guardados na carruagem de um comboio de sabão. a tua modéstia sempre me causou dano. se aquilo que desejas não sou eu, quem te deu o direito de trincar para tirar a prova? é que os teus dentes de prata cravam-me a pele e doem, porque. eu vivo no escuro, sabes? quem te trouxe para estas terras avisou-te que aqui o amor é mais intenso? que o rio tem um nome mais salgado do que as lágrimas das princesas? aqui, o que é doce também amarga. é como tu. se ficas ou vais. um dia queria ver o teu país. dizes que os montes são brancos e se assim é, de que cor é a pele das estrelas que caem neles? porque eu gosto de cores, sabes? mas prefiro sempre as tuas, é como quem te escolhe para seres a mais bonita. a luz que resplandece de ti é a que que eu gostava de ter para me iluminar. gostava de te conhecer de novo noutro tempo. noutro sítio. só nós. teríamos mais sorte, talvez. poderíamos escolher não ser o que fomos antes. eu não seria virgem e tu não serias de longe. às vezes pergunto para onde irei quando tudo acabar, porque é isso que me aflige, o medo do fim, sabes? sempre quis ser mais do que aquilo que era, mas nunca fiz por ser mais do que aquilo que me deixavam ser. a expectativa de se esperar um dia para se ser o que não se foi antes, transforma a vida numa espécie de morte antecipada. é do género, espera que logo cantas. mas cantas o quê? que som? que melodia? que letra? quando o momento chega actuas de que forma, se não treinaste antes? mulher, eu nunca soube amar antes, como é que poderia acertar contigo? é como esperar aprender por ler nos livros. mas e na prática, como faço para te pegar na mão e arder? para te encostar a boca e não parecer perverso? mecânico? porque amor é mais do que encostar a boca, não é? amar é um sentimento dos olhos que não vêem, não é? sabes? eu apaixonei-me por ti e doeu esquecer que aquilo que fazias não era igual ao que esperava de ti. que as palavras são mais susceptíveis a magoar quando queremos afastar alguém. ou manter alguém como recluso. mas foda-se, que importa ser livre de dar às asas se não temos um sítio para pousar? para descansar, sabes? a tua pele tem o cheiro da baunilha mais sexy e o teu corpo já foi mais destrambelhado, mas é disso que eu gosto. de te querer tirar a camisola de lã que trazes do país dos montes brancos e descobrir que há linhas e curvas que não se vêem quando está nevoeiro. um dia gostava de subir a um lugar mais alto e gritar tudo o que me apetece. o vento tudo levou? mas levou para onde? será que as palavras batem nos montes do teu país e por serem fortes demais se transformam em pedaços de algodão para que não doam tanto ao tocar na superfície das coisas tristes? é assim que vocês pintam o mundo, não é? o branco serve de cegueira a tudo o que é doloroso? o branco serve de gelo a tudo o que pode doer? é por isso que vocês não sentem? ficam à superfície de tudo o que pode ferir. intoxicar. rasgar. dilacerar. ficam à espera que os comboios partam e larguem corações perdidos nos países vizinhos? de onde vieste, morena? a tua modéstia sempre me causou dano e aquilo que queres não sou eu. e tu. és só dos montes brancos.

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